O pardal
Eu devia ter uns seis anos quando caiu um filhote de pardal
no meu quintal.
Para sorte do pardal, eu o encontrei antes dos gatos da
vizinhança.
Corri para avisar os meus pais que o bichinho precisava ser
socorrido.
Nós usamos uma caixa de sapato para ele ficar e pusemos um
pano velho dentro para aquecê-lo.
Mas nenhum ato de carinho supera o que o meu pai fez. Ele
picou um pão em pedacinhos, mastigou e deu para o passarinho no bico.
Pai é herói, podem dizer o que quiser.
Vi as peninhas crescerem, o cinza dar lugar ao marrom até
ele começar a pular fora da caixa e arriscar os primeiros voos dentro de casa.
Era hora de dizer adeus.
Levamos para fora e soltamos. Se ele viveu, eu não sei, mas
fizemos a nossa parte.
Deve ter sido a primeira vez que me senti realizado. Foi uma
alegria indizível hospedar um pardalzinho em casa.
As crianças trocam energia com a natureza muito mais
facilmente que os adultos. É uma capacidade que esquecemos quando crescemos.
Muitos pardais nos visitam todos os dias. São pequenas
oportunidades de reconciliação consigo mesmo, com o mundo, com o planeta, com
Deus...
Perdemos por estarmos muito ocupados e preocupados com
outras coisas que julgamos mais importantes. E o resultado é aquela carranca
típica de gente velha. A raiva sem causa, a fadiga crônica, a incredulidade, a
tristeza.
Hoje quando lembro esse episódio, me reconecto com as coisas
simples da vida.
A memória da infância traz consigo o olhar de menino. Um olhar
aparentemente desatento, mas que sabe apreciar o que é mais importante para o
coração.
Recordo-me que um ato heroico não precisa de mais que
algumas migalhas de pão.
Que a vida pode habitar em uma pequenina caixa de
papelão.
Que o frio da morte pode ser espantado com um pedaço de pano velho.
E
que o amor puro e sincero é a única coisa que preserva a vida na Terra.
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